quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Nova ajuda a Portugal

Por Pedro Braz Teixeira, publicado em 29 Fev 2012 - 03:00 | Actualizado há 17 horas 27 minutos

Portugal deverá precisar de nova ajuda externa, mesmo que respeite todos os compromissos com a troika, porque não deverá conseguir voltar aos mercados já em 2013




  • bandeira de portugal

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Este texto é de Isabel do Carmo (médica). E tem toda a razão.

O primeiro-ministro anunciou que íamos empobrecer, com aquele desígnio de falar "verdade", que consiste na banalização do mal, para que nos resignemos mais suavemente. Ao lado, uma espécie de contabilista a nível nacional diz-nos, como é hábito nos contabilistas, que as contas são difíceis de perceber, mas que os números são crus. Os agiotas batem à porta e eles afinal até são amigos dos agiotas. Que não tivéssemos caído na asneira de empenhar os brincos, os anéis e as pulseiras para comprar a máquina de lavar alemã. E agora as jóias não valem nada. Mas o vendedor prometeu-nos que... Não interessa.

Vamos empobrecer. Já vivi num país assim. Um país onde os "remediados" só compravam fruta para as crianças e os pomares estavam rodeados de muros encimados por vidros de garrafa partidos, onde as crianças mais pobres se espetavam, se tentassem ir às árvores. Um país onde se ia ao talho comprar um bife que se pedia "mais tenrinho" para os mais pequenos, onde convinha que o peixe não cheirasse "a fénico". Não, não era a "alimentação mediterrânica", nos meios industriais e no interior isolado, era a sobrevivência.

Na terra onde nasci, os operários corticeiros, quando adoeciam ou deixavam de trabalhar vinham para a rua pedir esmola (como é que vão fazer agora os desempregados de "longa" duração, ou seja, ao fim de um ano e meio?). Nessa mesma terra deambulavam também pela rua os operários e operárias que o sempre branqueado Alfredo da Silva e seus descendentes punham na rua nos "balões" ("Olha, hoje houve um ' balão' na Cuf, coitados!"). Nesse país, os pobres espreitavam pelos portões da quinta dos Patiño e de outros, para ver "como é que elas iam vestidas".

Nesse país morriam muitos recém-nascidos e muitas mães durante o parto e após o parto. Mas havia a "obra das Mães" e fazia-se anualmente "o berço" nos liceus femininos onde se colocavam camisinhas, casaquinhos e demais enxoval, com laçarotes, tules e rendas e o mais premiado e os outros eram entregues a famílias pobres bem- comportadas (o que incluía, é óbvio, casamento pela Igreja).

Na terra onde nasci e vivi, o hospital estava entregue à Misericórdia. Nesse, como em todos os das Misericórdias, o provedor decidia em absoluto os desígnios do hospital. Era um senhor rural e arcaico, vestido de samarra, evidentemente não médico, que escolhia no catálogo os aparelhos de fisioterapia, contratava as religiosas e os médicos, atendia os pedidos dos administrativos ("Ó senhor provedor, preciso de comprar sapatos para o meu filho"). As pessoas iam à "Caixa", que dependia do regime de trabalho (ainda hoje quase 40 anos depois muitos pensam que é assim), iam aos hospitais e pagavam de acordo com o escalão. E tudo dependia da Assistência. O nome diz tudo. Andavam desdentadas, os abcessos dentários transformavam-se em grandes massas destinadas a operação e a serem focos de septicemia, as listas de cirurgia eram arbitrárias. As enfermarias dos hospitais estavam cheias de doentes com cirroses provocadas por muito vinho e pouca proteína. E generalizadamente o vinho era barato e uma "boa zurrapa".

E todos por todo o lado pediam "um jeitinho", "um empenhozinho", "um padrinho", "depois dou-lhe qualquer coisinha", "olhe que no Natal não me esqueço de si" e procuravam "conhecer lá alguém".

Na província, alguns, poucos, tinham acesso às primeiras letras (e últimas) através de regentes escolares, que elas próprias só tinham a quarta classe. Também na província não havia livrarias (abençoadas bibliotecas itinerantes da Gulbenkian), nem teatro, nem cinema.

Aos meninos e meninas dos poucos liceus (aquilo é que eram elites!) era recomendado não se darem com os das escolas técnicas. E a uma rapariga do liceu caía muito mal namorar alguém dessa outra casta. Para tratar uma mulher havia um léxico hierárquico: você, ó; tiazinha; senhora (Maria); dona; senhora dona e... supremo desígnio - Madame.

Os funcionários públicos eram tratados depreciativamente por "mangas-de-alpaca" porque usavam duas meias mangas com elásticos no punho e no cotovelo a proteger as mangas do casaco.

Eu vivi nesse país e não gostei. E com tudo isto, só falei de pobreza, não falei de ditadura. É que uma casa bem com a outra. A pobreza generalizada e prolongada necessita de ditadura. Seja em África, seja na América Latina dos anos 60 e 70 do século XX, seja na China, seja na Birmânia, seja em Portugal

É por isso que eu deixei de comer carne...

Não foi só por questões de saúde, mas também pelo que vão ver neste filme que eu não como carne, peixe ou qualquer produto de origem animal, damos aos nossos filhos, animais maltratados, stessados e cheios de toxinas:

'Meet Your Meat'

'MEET YOUR MEAT'

In a moving narration, actor and activist Alec Baldwin exposes the truth behind humanity's cruelest invention―the factory farm. LEARN MORE >>

Dia de sol...inverno que não existiu...

Querem uma Luz Melhor que a do Sol!AH! QUEREM uma luz melhor que
a do Sol!
Querem prados mais verdes do que estes!
Querem flores mais belas do que estas
que vejo!
A mim este Sol, estes prados, estas flores contentam-me.
Mas, se acaso me descontentam,
O que quero é um sol mais sol
que o Sol,
O que quero é prados mais prados
que estes prados,
O que quero é flores mais estas flores
que estas flores -
Tudo mais ideal do que é do mesmo modo e da mesma maneira!

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Heterónimo de Fernando Pessoa

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Hoje saí...

Desde sábado que estava em casa doente com gripe e rinite. Hoje fui com a minha filha mais velha almoçar vegan no restaurante Jardim dos Sentidos, ah como eu gosto de comer assim, já não vejo a minha vida a comer doutra maneira e o melhor de tudo é que me sinto bem, em termos de saúde, que é o mais importante. Tratei de uns assuntos no banco e fomos mandar fazer as molduras para as litografias que eu trouxe da Índia e ainda outros assuntos pendentes. Fui à farmácia e depois para casa. Tenho às vezes muitas coisas acumuladas e sabe-me bem resolve-las de uma vez, amanhã vai ser dia de compras. O João Pedro que me traz cá a casa os legumes biológicos está com gripe e não veio esta semana, fez-me diferença, por isso amanhã terá o meu marido que ir comprar produtos que me fazem falta, porque ele tem que ajudar.
Acabei de reler como já devo ter dito «A tragédia da Rua das Flores», esta Lisboa de hoje tem ainda muitos resquícios da Lisboa de outrora, ainda sinto que somos aldeias dentro desta cidade com as diferentes particularidades. Este livro foi um ensaio para ele escrever os «Maias», que é muito mais apurado e vai ser interessante lê-lo outra vez e compará-lo com este, com a «tragédia floral». Vamos começar o fim de semana, era bom que chovesse. Eu gosto das quatro estações e estranhamente para algumas pessoas, gosto do Outono e do Inverno. Gostava de ter nascido num país frio.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Estou a reler a Tragédia da Rua das Flores e a propósito:

Uma frase muito oportuna de Eça de Queirós:

Nas nossas democracias a ânsia da maioria dos mortais é alcançar em sete linhas o louvor do jornal. Para se conquistarem essas sete linhas benditas, os homens praticam todas as ações - mesmo as boas.


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Inquilinos de Lisboa querem falar com a troika

Comissão de Inquilinos das Avenidas Novas quer ser recebida pela troika para que esta a esclareça sobre contradições da lei das rendas, hoje aprovada no Parlamento.

Sexta feira, 17 de fevereiro de 2012

A Comissão de Inquilinos das Avenidas Novas, em Lisboa, enviou uma carta a solicitar uma audiência à troika sobre a nova proposta de lei do arrendamento, por terem encontrado divergências entre o FMI e o Governo.

Num comunicado enviado à imprensa, os inquilinos referem que pediram segunda-feira aos "representantes da Comissão Europeia, FMI e BCE uma audiência a fim de esclarecer se o período de transição de cinco anos constante da atual proposta de arrendamento do Governo, findo o qual as rendas dos contratos antigos serão liberalizadas, independentemente dos rendimentos dos inquilinos".

Segundo a comissão, o prazo imposto pela troika contradiz o programa do Governo, apresentado em junho de 2011, onde se referia um prazo de 15 anos para rever o regime dos contratos celebrados antes de 1990.

A Comissão quer sensibilizar a troika para as consequências nefastas desta lei, sobretudo, nos idosos e obter esclarecimentos para divulgar aos inquilinos, na próxima assembleia de dia 27 de fevereiro, às 18h30, na Escola Preparatória Eugénio dos Santos.

Nova lei das rendas aprovada no Parlamento


Também a Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL) mostrou-se hoje preocupada com os efeitos da nova lei das rendas.

A AIL acusou o Governo de pretender "conceder aos senhorios a possibilidade de imporem o aumento das rendas, sejam antigas ou mais recentes, mesmo aos inquilinos com mais de 65 anos, deficiência superior a 60% ou com baixos rendimentos, ou seja, para valores acima dos 400 euros/mês", refere em comunicado.

A nova lei das rendas foi hoje aprovada no Parlamento, com a abstenção do PS e o chumbo do PCP, BE, PEV e do socialista Miguel Coelho.

A proposta do Executivo prevê despejos mais rápidos, com uma alternativa extra-judicial através do novo Balcão Nacional de Arrendamento (BNA), a atualização de rendas antigas, anteriores a 1990, e ainda incentivos fiscais para a reabilitação urbana.



Ler mais: http://aeiou.expresso.pt/inquilinos-de-lisboa-querem-falar-com-a-itroikai=f705204#ixzz1mfTrA19k

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Esta é a história construída pela Ana, Marta , Maria Alcina, Maria Emília e Manuela entre e-mails, uma começava e a outra terminava.

Fizemos um pequeno curso e o resultado foi este trabalho colectivo.

As aventuras de Alcatruz e Catrapuz

Era uma vez dois príncipes irmãos, chamados Alcatruz e Catrapus. Os príncipes eram muito belos de dia, mas à noite tinham uma maldição: transformavam-se em caracóis e vagueavam pelas folhas de uma nespereira que havia num pátio esconso do principesco castelo. A maldição tinha-lhes sido imposta pelo pai, o rei, que era bruxo, e que pensava com isso conseguir que os príncipes nunca casassem.

Os belos príncipes de dia lamentavam o seu destino:

- Ai, deuses! O que faremos da nossa vida? Eternamente condenados a vaguear por uma nespereira, num pátio vigiado pelo nosso velho criado… o que faremos quando ele morrer? Quem nos protegerá de sermos pisados miseravelmente e assim acabarmos a nossa existência? Oh, deuses, ajudai-nos! –

Os deuses ficavam normalmente surdos às preces de Alcatruz e Catrapus, mas um dia passou uma bela fada que ouviu chorar. Sendo um ser bondoso e compassivo, procurou curiosa a origem desse choro e encontrou os belos Alcatruz e Catrapus sentados numa coluna tombada do pátio recuado, à espera de serem transformados em vis lesmas.

A bela fada condoeu-se com tamanha tristeza daqueles pobres rapazes que resolveu ajudá-los, mas a tarefa era assaz difícil. Pensou, pensou e tornou a pensar e de repente disse:

- Tereis que ir à montanha dos sete elementos e aí, à noite, encontrareis uma velha mulher cujas orelhas lhe crescem de tal maneira que levantam voo. Se conseguirem pendurar-se nessas orelhas gigantes sem que ela dê por isso, podereis conhecer o caminho da gruta das mariposas e aí vereis como ela retira das plantas carnívoras, que lá existem, uma poção mágica que desfaz qualquer bruxaria, mas cuidado com essas plantas, pois podem engolir-vos de uma só vez se não disserem a palavra secreta, que só essa velha mulher sabe e que vós tendes de estar muito atentos para ouvi-la, para quando voltarem sozinhos a esse lugar, nada vos poderá correr mal.

Depois deste extraordinário acontecimento ficaram perplexos e foram assaltados por dúvidas tremendas. Lembraram-se então de contar tudo às suas primas Bimbinela e Pimpinela que viviam com eles na corte. Elas poderiam dar uma opinião e assim lá foram a correr para o palácio porque já entardecia e dentro de pouco tempo transformar-se-iam em caracóis.

Encontraram as primas na sala do 1º andar do palácio e, como o dia estava a chegar ao fim, apressaram-se para falar com elas, pedindo-lhe ajuda para tão delicado problema.

Começa tu, Alcatruz – diz o Catrapus com voz nervosa. Conta tu, Catrapus que eu tenho a memória mais fraca daquela queda que dei do cavalo quando era pequeno, alega o Alcatruz.

A noite aproximava-se mas era necessário por as primas a par da solução sugerida pela fada e colher as sugestões que lhes quisessem dar. Catrapus mostrou-se feliz por poderem encontrar a solução para deixarem de ser lesmas durante a noite, mas arriscado pela falta de prática de voarem em orelhas, sobretudo sem a velha dar por isso.

Mas o problema maior era a falta de ouvido que ambos tinham quando se transformavam em caracois, pois o facto de passarem grande parte da noite dentro da concha, não lhes deixou desenvolver a acuidade auditiva necessária para perceber a palavra secreta que a velha iria pronunciar junto da planta carnívora.

As primas ouviram atentamente a descrição do caminho e dos riscos que esperavam os príncipes para deixarem de se transformar em caracóis durante a noite, e comunicaram-lhes as suas opiniões: - que ficassem tranquilos, que elas lhes iam resolver o problema e muito brevemente.

Bimbinela e Pimpinela retiraram-se para os seus aposentos, mas já no trajecto, cada uma por si, ia analisando a situação. O palácio era imenso, salas e salas, corredores e corredores, pátios e jardins, pelo que quando chegaram aos seus aposentos o plano estava idealizado. Agora, era só confrontar as ideias individuais, mas estavam convencidas, porque faziam sempre idêntica interpretação das situações, que tinham analisado bem a situação trágica dos primos, a urgência de lhes por fim e pensado até a quem iriam pedir ajuda.

Divertidas, verificaram que mais uma vez tinham pensado igual e com pequenas gargalhadas e bater leve dos pezinhos no chão, não fossem ser repreendidas por qualquer aia que as ouvisse, pelo comportamento pouco próprio de princesas, manifestavam assim o seu regozijo.

E, imediatamente, mandaram bilhetinhos, por dois pombos reais, às duas madrinhas as fadas Miriam e Ísis.

Como devem saber, os pombos reais são pombos-correios, muito treinados em alcançar metas e obter classificações pelo melhor desempenho não só na velocidade como nos caminhos escolhidos para chegarem aos seus destinos.

O Pintado e o Jeitoso, os nossos pombos estavam em 1º lugar para cumprirem esta missão.

Partiram ao cair do dia, com os papelinhos atados aos respectivos pés, com o mesmo pedido, não fosse algum deles perder- se pelo caminho ou ter um acidente. Era uma longa distância a percorrer até chegarem ao destino no cimo do monte, cerca do grande lago, quase no país dos deuses, já muito perto do sol e onde as fadas habitavam

Orientados pela luz da lua que se refletia sobre os telhados das casas das vilas e das aldeias e nos rios que serpenteavam entre os campos, sobrevoaram durante alguns dias a distância que os separava do sopé da Montanha da Água Azul pois o seu reflexo sobre as águas via-se a grande distância como num espelho. Entretanto iam descansando durante o dia nas quintas e nos campos, alimentando-se de sementes e de pequenos grãos e bebendo na frescura dos regatos.

Quando ali chegaram resolveram separar-se e cada um partiu vertiginosamente e percorreu vertentes distanciadas uma da outra que levavam aos palácios das duas fadas madrinhas Miriam e Ísis.

O Pintado, com a sua mancha de penugem escura ao longo do peito, o que lhe dava uma certa presença e imponência, poisou numa das torres do palácio de Cristal perto duma sacada virada sobre os quintais. Vendo uma janela entreaberta, aí se refugiou a descansar e a piar e a procurar alguém com os olhos muito atentos

Foi acertar por pouca sorte na janela da cozinha do palácio e a cozinheira vendo tão belo petisco correu logo de faca em riste disposta a cortar-lhe o pescoço. Fugiu precipitadamente e em baixo refugiou-se no jardim das rosas mirando o Palácio em frente dos seus olhos, a sua formosura e o resplandecente aspecto dos portais, janelas e torres incandescentes com miríades de cores irisadas que irradiavam uma luz deslumbrante e entontecedora

Encolheu-se e descansou o olhar na beleza do roseiral colorido, mas repousante de formas e de cores matizadas de verdes e púrpuras e também de brancos e amarelos.

Nesta hora de sol matinal a fada Miriam passeava entre as flores e admirada avistou-o. Chamou-o, ele voou para o seu ombro ela retirou o papel da sua patinha e leu: - Somos as primas Bimbinela e Pimpinela e o Catrapuz e o Alcatruz correm grandes perigos. Venha com a fada Ísis, depressa, ao nosso encontro.

Miriam levou num braço o Pintado e recolheu-o até à noite. Entretanto comunicou com Ísis.

O Jeitoso alcançou o Palácio de mármore rosa com as suas torres e paredes cobertas de flores e folhas incrustadas, feitas em pedras semipreciosas, de mármores coloridos em volutas que o tornavam majestoso em grandeza e leve no esplendor da arte aplicada nas suas paredes e formas.

Como era muito amigo de ajudar, o Jeitoso refugiou-se no jardim das macieiras onde os pássaros, seus amigos de tradição, cantavam, chilreavam e piavam. Tentilhões, melros, rolas, toutinegras e os outros lá no alto, lá em cima no céu azul voavam as águias e os abutres que lhe chamavam um figo e o papavam num instante e no chão, nos campos abertos, os gatos e as raposas e outros que tais, saltavam-lhe em cima e era uma vez um Jeitoso .

Instalou-se entre os ramos duma macieira onde aspirava repousadamente o seu perfume e regalava-se com a visão das suas flores rosadas e branca

A fada Ísis também desfrutava do pomar apanhando frutos para dentro dum cesto colocado no chão. Não tardou a enxerga-lo, aproximou-se para o afagar e logo viu o bilhetinho na patinha. Leu-o: - "Venha com a fada Miriam ao nosso encontro - Bimbinela e Pimpinela , a vida dos primos Catrapuz e Alcatruz depende das madrinhas". Logo o recolheu até ao anoitecer e avisou a Miriam. Ficou o Jeitoso recolhido até ao pôr do sol e logo que a lua apareceu, lançou-se no ar com voos e pios e logo ouviu os pios do seu grande amigo o Pintado. Entretanto, durante o dia as fadas tinham colocado os bilhetes de resposta nas respectivas patinhas que diziam "sim, lá estaremos, antes do anoitecer daqui a cinco dias à entrada da gruta das Mariposas, aguardando a chegada do Catrapuz e do Alcatruz.

Antes de anoitecer, as fadas viram aproximar-se escondidos nas asas/orelhas da bruxa os medrosos Alcatruz e Catrapuz, à entrada da gruta as asas da bruxa encolheram, transformando-se nas naturais orelhas e eles caíram desamparados aos pés das fadas.

-Ai, ai, dói-me as costas, dizia o Alcatruz, ai, ai dói-me o joelho, dizia o Catrapuz.

- Levantem-se imediatamente suas avantesmas, sejam príncipes de verdade, disse a fada Ísis que era madrinha de um dos rapazes, não perceberam que tinham de saltar antes que as orelhas da bruxa encolhessem?

- Não, não, a querida madrinha sabe que nós não ouvimos bem, disse Alcatruz com voz baixinha.

- Calem-se e vamos ao assunto, interrompeu a fada Miriam, entrem, entrem depressa que eu vou tornar-vos invisíveis.

- Muito a medo os príncipes entraram e as fadas enfiaram-lhes nas orelhas um liquido pastoso, vermelho e com a varinha mágica disseram ao mesmo tempo – Plimplão avestruz, catrapim, almoster, perlimpimpim venha quem vier, que não ides ficar visíveis mas sim transparentes, tráscatrapás, já está.

- Ah já oiço bem, e tu Catrapuz? Oiço maravilhosamente disse o outro príncipe encantado.

- Atenção, disseram as fadas, neste momento estais transparentes, mas não conseguimos tirar os quatro pontos vermelhos correspondentes ao líquido dos vossos ouvidos, por isso esses quatro pontinhos vermelhos, mais um pontinho laranja do cristal que nós espetámos na cabeça do Alcatruz para ele recuperar a memória vão estar visíveis. Ela, a bruxa, não vos vai ver mas vai reparar nos quatro pontos vermelhos e no ponto laranja, tende cuidado. Entrai, entrai e ouvi a palavra secreta.

Os príncipes entraram mais confiantes e aproximaram-se da bruxa que estava a regar as plantas carnívoras, esconderam-se atrás e tentaram perceber o que ela dizia, mas de repente a mulher voltou-se e inebriada pelas luzes vermelhas e laranja gritou – o que é isto?

Os príncipes aterrorizados não se mexiam do lugar, só tremiam e as luzes também.

- Vou dar-vos com este varapau pássaros intrometidos, disse a bruxa, pois pensava que algumas aves tinham entrado na gruta - e é para já. Os príncipes então correram para debaixo de uma vegetação muito densa, enquanto a velha esbaforida dava safanões com o pau para todo o lado, mas ela não conseguiu acertar nos pobres príncipes amedrontados que como já era noite estavam transformados em caracóis.

- Já dei cabo deles - disse a bruxa satisfeita, já posso ir fazer o meu trabalho sossegada. Aproximou-se então das plantas carnívoras e disse a palavra mágica «limpoescalifroso». Logo que esta palavra se ouviu as plantas carnívoras ficaram mansas e deixaram a velha retirar do seu interior a poção mágica que logo colocou num pote de barro, mas infelicidade das infelicidades, o pote foi colocado em cima da folhagem onde estavam escondidos os príncipes em forma de lesmas e fez algumas feridas nas cascas e corninhos dos caracóis pois eles para ouvirem bem a frase tinham os ditos bem atentos e não escondidos.

A bruxa mal terminou o seu trabalho saiu, as orelhas cresceram e lá foi ela a voar. As fadas Isis e Miriam aproximaram-se, pois também elas estavam escondidas a assistir á cena e disseram a frase mágica bem alto «limpoescalifrosoooooooooooooo» que se ouviu no reino. Retiraram a poção mágica das plantas e esfregaram as lesmas com ela.

Os príncipes gemiam debaixo da folhagem e as fadas madrinhas trataram de os retirar, mas ficaram espantadas com o estado deles. Alcatruz tinha as duas orelhas por um fio e Catrapuz o nariz esborrachado.

- Como é que vamos casar, assim com este aspecto? Disse Catrapuz

- Como é que nos vamos tratar, as minhas orelhas vão cair, disse choramingando Alcatruz.

- Sim, isto é um problema, não sabemos tratar deste assunto, somos ainda fadas do 2º grau. Mas vamos para a corte, logo pensaremos o que vamos fazer, disseram as fadas muito contristadas.

Chamaram então as águias reais e nas suas asas voaram para o castelo.

Voaram sobre montes, vales, rios e ribeiros, ribeirões e riachos, até chegarem ao belo castelo cujos bicudos telhados de ardósia rebrilhavam à luz da lua. A noite estava muito bela, não se via uma única nuvem no céu. Ao aterrarem no pátio do castelo as fadas despediram-se de Alcatruz e Catrapus, a quem entretanto tinham colocado uns emplastros mágicos.

- Meus queridos príncipes, vamos estudar a melhor forma de vos curarmos. Até lá, mantei-vos afastados do vosso pai, que ainda não sabe que vos livrastes da maldição e seria capaz de tentar alguma manobra menos conducente ao vosso bem-estar e satisfação.

- Mas deixais-nos assim, de nariz esmagado e de orelhas mal sustidas por estes dois emplastros?!

- Sim, porque são emplastros mágicos e aguentarão os vossos apêndices no sítio até encontrarmos os filtros de cura específicos para os vossos casos.

- E como explicaremos estas nossas maleitas? – perguntou Alcatruz, sempre o mais atento no que diz respeito aos aspetos de condução da história.

- Dizei que vos magoastes na aula de esgrima. –

- E o meu nariz? – perguntou Catrapus.

- No boxe. –

- Ah, tendes resposta para tudo, felizmente – Catrapus respirou aliviado, e os dois príncipes despediram-se das belas fadas, que subiram para as suas montadas aladas e se ergueram nos ares, cheias de elegância e donaire, como só as fadas e algumas princesas sabem ter.

Aos poucos, começaram a ter a mesma ideia:

-Alcatruz!

- Catrapus!

- Esta é a primeira noite que passamos enquanto homens!

- Estava a pensar no mesmo!

- Que felicidade!

- Que alegria!

Os dois quase se puseram a dançar, mas lembrando-se das recomendações das fadas, seguiram pé ante pé para os seus quartos e trancaram-se por dentro muito bem aferrolhados até ao raiar do dia.

Contudo, o que eles não podiam saber é que o Rei, por virtude da sua bola mágica de cristal, tinha acompanhado toda a ação em direto e, com uma profunda gargalhada, afastou-se da janela por onde tinha espreitado e visto os príncipes chegar…

FIM

Pinóquio...onde estás tu?

Qual é o teu valor de mercado?


Francisco Queirós

http://www.asbeiras.pt/2012/01/qual-e-o-teu-valor-de-mercado/

“Qual é o teu valor de mercado, mãe? Desculpa escrever-te uma pequena carta, mas estou tão confuso que pensei que escrevendo me explicava melhor.

Vi ontem na televisão um senhor de cabelos brancos, julgo que se chama Catroga, a explicar que vai ter um ordenado de 639 mil euros por ano na EDP, aquela empresa que dava muito dinheiro ao Estado e que o governo ofereceu aos chineses.

Pus-me a fazer contas e percebi que o senhor vai ganhar 1750 euros por dia. E depois ouvi o que ele disse na televisão. Vai ganhar muito dinheiro porque tem o seu valor de mercado, tal como o Cristiano Ronaldo. Foi então que fiquei a pensar. Qual é o teu valor de mercado, mãe?

Tu acordas todos os dias por volta das seis e meia da manhã, antes de saíres de casa ainda preparas os nossos almoços, passas a ferro, arrumas a casa, depois sais para o trabalho e demoras uma hora em transportes, entra e sai do comboio, entra e sai do autocarro, por fim lá chegas e trabalhas 8 horas, com mais meia hora agora, já é noite quando regressas a casa e fazes o jantar, arrumas a casa e ainda fazes mil e uma coisas até te deitares quando já eu estou há muito tempo a dormir.

O teu ordenado mensal, contaste-me tu, é pouco mais de metade do que aquele senhor de cabelos brancos ganha num só dia. Afinal mãe qual é o teu valor de mercado? E qual é o valor de mercado do avozinho? Começou a trabalhar com catorze anos, trabalhou quase sessenta anos e tem uma reforma de quinhentos euros, muito boa, diz ele, se comparada com a da maioria dos portugueses. Qual é o valor de mercado do avô, mãe? E qual é o valor de mercado desses portugueses todos que ainda recebem menos que o avô? Qual é o valor de mercado da vizinha do andar de cima que trabalha numa empresa de limpezas?

Ontem à tardinha ela estava a conversar com a vizinha do terceiro esquerdo e dizia que tem dias de trabalhar catorze horas, que não almoça por falta de tempo, que costumava comer um iogurte no autocarro mas que desde que o motorista lhe disse que era proibido comer nos transportes públicos se habituou a deixar de almoçar. Hábitos!

Qual é o valor de mercado da vizinha, mãe? E a minha prima Ana que depois de ter feito o mestrado trabalha naquilo dos telefones, o “call center”, enquanto vai preparando o doutoramento? Ela deve ter um enorme valor de mercado! E o senhor Luís da mercearia que abre a loja muito cedo e está lá o dia todo até ser bem de noite, trabalha aos fins de semana e diz ele que paga mais impostos que os bancos?

Que enorme valor de mercado deve ter! O primo Zé que está desempregado, depois da empresa onde trabalhava há muitos anos ter encerrado, deve ter um valor de mercado enorme! Só não percebo como é que com tanto valor de mercado vocês todos trabalham tanto e recebem tão pouco! Também não entendo lá muito bem – mas é normal, sou criança – o que é isso do valor de mercado que dá milhões ao senhor de cabelos brancos e dá miséria, muito trabalho e sofrimento a quase todas as pessoas que eu conheço!

Foi por isso que te escrevi, mãe. Assim, a pôr as letrinhas num papel, pensava eu que me entendia melhor, mas até agora ainda estou cheio de dúvidas. Afinal, mãe, qual o teu valor de mercado? E o meu?”

Quem sabe a resposta?