sábado, 29 de novembro de 2008


Ao passar pelo espelho parou, olhou e tornou a olhar. Foi buscar o outro espelho, aquele que aumenta sem piedade. Pior do que as rugas, as pequenas manchas que começam a aparecer na pele e a carne outrora rija, um pouco descaída. O brilho dos olhos era o mesmo, um brilho que sempre a acompanhou, um desejo de que aquele olhar veja sempre em frente, um olhar que observa um dia de cada vez. Às vezes ela tinha a ilusão de que nunca envelheceria, que chegava a uma certa idade e parava, só se confrontou pela primeira vez com a realidade quando tirou a foto para o último cartão de identidade, aquele que tem validade por dez anos e olhou a sua imagem no que tinha caducado. Que diferença em tão pouco tempo.
A solução é misturar a vida de todos os dias com uma mescla de sonho q.b., a realidade nua e crua com a ilusão criada por si. Eu sou jovem de espírito pensa ela, quando afasta o espelho, é o que mais interessa e ri-se desta encenação.
O segredo está em sair de casa encontrar-se com pessoas, conhecidas ou não, viver, respirar e agradecer o que de bom se tem em cada dia. O Saramago se a lesse acharia que ela é ridícula, pois o mundo segundo a perspectiva dele é negro e cego e ela tem pensamentos de esperança e encontra por aqui e por ali pequenos nichos de felicidade e de alegria, apesar do caos que sente no mundo que a rodeia, apesar da agressividade com que é confrontada de vez em quando, seja por quem for.
Olha a nesga de oceano pela sua janela, as árvores no outono despem-se de folhas e aproximando-se o inverno ficam nuas e aguardam com esperança os primeiros sinais de Primavera e as folhinhas verdes e tenras que vão aparecer.
O seu dia a dia passa pelas quatro estações, às vezes melancólica, às vezes nua, mas sempre com esperança das novas folhas e do sol.
Nunca tinha feito operações estéticas, nem tratamento que repuxa e não vai fazer nunca. Massagens e outras técnicas para aliviar o corpo e a alma sim, mas meter o bisturi e puxar a pele para detrás das orelhas ou ir tirar pele às pernas para colocar no rosto, não o fará. Como está a emagrecer, devagar mas está, pensou ela talvez tenha que tirar algumas peles e então não poderá dizer, desta água não beberei, mas para onde irá a pele excedentária, para o lixo? Que horror, bocados de si que se deitam fora como se fossem papel de embrulho. Bem, concluiu ela, para divagações por hoje chega.

3 comentários:

Anónimo disse...

Querida Anad
O teu texto está muito bom.Adorei lê-lo.Tem tudo o que é preciso.Valeu!
Vim só dar um olá porque vou ficar sem PC durante algum tempo.
Fica bem.Beijo carinhoso
Dri

gaivota disse...

um texto muito lindo, minha amiga, para meditar...
boa semana
beijinhos

Anónimo disse...

Realmente um texto que nos faz pensar e meditar em tudo aquilo que nós mulheres deitamos fora...
Valeu a pena.