Perspectivas
A minha rua é uma aldeia,
tem dez casas e outras tantas de árvores,
mas é diferente das aldeias,
daquelas a que eu chamo aldeias.
É uma rua pequena, mas ninguém se conhece,
todos vivem nas suas casas
e murmuram com sons incompreensíveis
a saudação.
Há muitos cães como nas aldeias,
mas estão fechados de dia
e à noite aparecem ferozes junto aos portões.
Todos os jardins estão arranjados de igual modo,
com anões, cogumelos de loiça a enfeitá-los,
como no filme da Amélie Poulain.
Eu tenho uma pequena horta, mas pensava que era a única,
até que o velho vizinho do lado, que eu nunca tinha visto
me veio oferecer limões, tomates e ovos.
Afinal somos dois os aldeões,
eu dei-lhe umas garrafas de vinho
e coentros, ele disse-me obrigada
e plantou-me dois limoeiros no jardim.
Agora tenho rosas e limoeiros, alfaces e gerbérias,
cactos, pepinos e coentros,
salsa, hortelã, jasmim, hortenses e ameixas,
beringelas, tomates, buganvílias e courgettes,
larangeiras, esterlícias, malmequeres e outras plantas verdes.
O meu vizinho olha o meu jardim com um olhar admirado,
«está tudo um pouco misturado», diz baixinho,
«a minha horta é num terreno longe daqui, assim nunca vi»,
afinal sou mais aldeã do que ele,
mas sou uma aldeã contemporânea,
a ideia é o mais importante e mesmo que não esteja tudo alinhado
e perfeito é a minha ideia concretizada e original.
Só que não tenho nem quero ter anões, cães e cogumelos de loiça,
seria uma afronta para a minha cadela e para os melros,
que fizeram ninho no meu jardim/horta.
Tenho uma coisa em comum com os meus vizinhos,
o oceano, o azul ao longe no fundo da nossa aldeia.
Anad
4 comentários:
Cheiros, como eu adoro odores táteis. Como eu amo poesia que me levam a eles. Meus odores, táteis. abçs
gosto dessa ideia de ser uma aldeã contemporânea. gosto dos aromas do teu poema.
beijos
que interessante! eu vivo numa aldeia na zona de loures... toda a gente se conhece, excepto eu, que conheço pouca gente... mas todos me/nos conhecem, não sou muito de rua ou cafés!
apenas na nazaré, aí sim, somos todos uma família à beira mar!
bom domingo
beijinhos
(os meus coelhinhos vivem à solta num quintal ainda grandinho...)
A minha aldeia é na vertical com nove andares. Nem sequer conheço os aldeões do meu andar.
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